"Tybyra - Uma Tragédia Indígena Brasileira" é um espetáculo de enorme relevância histórica e cultural， que resgata uma narrativa silenciada e a transforma em um grito de resistência e memória. Idealizado， escrito e interpretado por Juão NynRed Tiger Gaming Pelataan， artista potyguara， a peça se baseia em um evento documentado em 1614， em São Luís do Maranhão， quando Tybyra， um indígena Tupinambá， foi condenado à morte por sodomia por soldados franceses. Preso à boca de um canhão， prestes a ser executado， Tybyra profere suas últimas palavras， que ecoam como um ato final de resistência.
A peça reconta o que é considerado o primeiro caso documentado de LGBTfobia no Brasil， envolvendo um corpo indígena. Ao trazer essa história à tona， Nyn denuncia a violência colonial e explora as intersecções entre opressão racial， sexual e cultural. Tybyra simboliza a resistência de um povo e de uma identidade sistematicamente apagada.
A narrativa reflete criticamente sobre as dinâmicas de dominação e violência do processo de colonização. A sodomia， usada como pretexto para a execução de Tybyra， serve como metáfora para a repressão às identidades e expressões de gênero e sexualidade que desafiavam os padrões coloniais.
Um dos aspectos mais marcantes do espetáculo é o uso predominante da língua tupi， que reforça a autenticidade da representação e resgata uma língua suprimida pelo colonialismo. As palavras de Tybyra， proferidas no idioma originário pelo protagonista， assumem um caráter ritualístico， tornando-se ato de afirmação de sua identidade.
Juão Nyn entrega uma atuação poderosa， transmitindo dor， resistência e， acima de tudo， dignidade. Sua conexão com o público acontece de forma orgânica na medida em que explora recursos teatrais que vão além do texto falado. A trilha sonora original， composta por Clara Potiguara e executada ao vivo， amplia a força dramática da cena， criando uma experiência intensa. Elementos ritualísticos e performáticos， como dança e canto， remetem às tradições Tupinambá， e a cena da execução， central na narrativa， tem uma carga emocional avassaladora， utilizando recursos visuais e sonoros que destacam a brutalidade do período retratado.
O trabalho de Juão Nyn é essencial no cenário cultural brasileiro， especialmente em um momento em que pautas indígenas e LGBTQIA+ ganham visibilidade， mas ainda enfrentam marginalização. Ao resgatar essa história， o ator questiona as estruturas de poder que continuam a oprimir corpos indígenas e dissidentes， inserindo-se no movimento de descolonização das artes. É um chamado para reconhecer a importância de Tybyra e de tantas outras vozes silenciadas， celebrando a resistência e a beleza dos corpos e identidades que desafiam a opressão.
jogo do tigre
Juão Nyn protagoniza a peça 039;Tybyra - Uma Tragédia Indígena Brasileira039;
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Matheus Jose Maria/Divulgação
Três perguntas para…
… Juão Nyn
Fortune Tiger 777Como você vê a importância de trazer à tona histórias indígenas， especialmente aquelas que envolvem questões de gênero e sexualidade?
Contar história é algo "careta" e até "banal" para muitas pessoas， por isso é tão poderoso， mantém mundos vivos. Sobre a questão de gênero e orientação sexual pela perspectiva nativa， é seguir reafirmando que independentemente de como chamar， sempre existimos e sempre existiremos. Seguiremos exercendo nossas naturezas e não baixaremos a cabeça， para manter a dignidade de nossas existências. Histórias assim， são por si só um ato anticolonial. Respeitem o que existe desde antes!
Qual a importância de manter partes da peça no idioma tupi-potiguara， e como você acha que isso impacta o público?
Fortune Tiger 777Muitas pessoas tem relatado， após assistirem ao espetáculo， que a experiência de ouvir tupi por cerca de uma hora é algo intenso， sensibilizador e impactante. Criar linguagem é difícil， faço parte da curva das mudanças históricas， alguns vão só estranhar mesmo， mas outros estão sendo cocriadores da nossa proposta artística， onde acreditamos que o teatro tem que ter muitos vazios para serem preenchidos pela mente do espectador.
Você acredita que o teatro pode ser uma ferramenta poderosa para combater a LGBTfobia e promover a conscientização sobre questões indígenas?
Com toda certeza contribui para que os horizontes — sobre qualquer tema — sejam ampliados. O teatro foi e sempre será um lugar profundo e complexo por mais que não pareça. Sinto na pele e nos meus órgãos o tupi voltando para o corpo.
Sesc Paulista - av. Paulista， 119， Bela Vista， região central. Qui. a sáb.， 20h. Dom.， 18h. Até 6/4. Duração: 70 minutos. A partir de R$ 15， em sescsp.org.br e nas bilheterias das unidades.
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